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sOBRE o pROJETO 

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iNTERVENÇÃO aRTÍSTICA

Meu processo criativo parte de impressões de um corpo feminino, vivente e experienciado na região do Recôncavo Baiano,

muitas formas insurgem sinalizadas dessas impressões que estão entranhados de simbologias locais onde o corpo acessado se permite aberturas com as quais podemos tratar das nossas fissuras e entraves.  Minha poética se abre para as histórias e ou estórias desses corpos seja a partir de narrativas de violências contra a mulher ou do meu imaginário dos símbolos que vivenciei desde a infância, ou da paisagem da cidade que nasci.  A performance então faz manifestar esse meu corpo feminino todas essas formas de inquietações vinda de um local complexo, intenso e amplamente cercado por energias como é o Recôncavo Baiano.

No intuito de abordar as diversas potências e experiências sentidas é que permito-me mergulhar em intervenções artísticas da qual intitulo de Rio de Tudo Isso II criada exclusivamente para o Prêmio Jorge Portugal. Este projeto aborda sobre um conjunto de entendimento sobre o ser humano na contemporaneidade e sua relação com o espaço natural que os cerca, e do qual neste projeto abordarei a relação que temos com o Rio, o grande Paraguaçu.

O Rio Paraguaçu, na linguagem Indígena significa Rio Grande, ele nasce na Barra da Estiva, corre solto por diversos municípios até passar entre as cidades de Cachoeira e São Félix e desemborcar na Bahia de Todos os Santos. É quando ele corre para o mar… guardando e lavando na sua imensa trajetória as histórias de múltiplas cidades. Mesmo assim em distintos momentos do nosso cotidiano corrido, mesmo sendo impossível não notar sua grandeza, suas águas escuras parecem invisíveis. O Rio só se torna visível em poucos momentos dando escoamento as preocupações que giram em torno da imprevisibilidade, como no caso as cheias que é quando as águas lambem e avançam o cais invadindo as principais ruas das duas cidades. Em um momento de incerteza atual como da difusão do vírus, aqui no Recôncavo, tivemos outras incertezas com a notícia da vazão das águas feita pela hidrelétrica pedra do cavalo, o que motivou uma preocupação em relação a uma possível enchente. Então o Rio passou a ser visível de uma maneira peculiar, no lugar de pensar em como o lixo é acumulado nas suas águas contribuindo para o desaparecimento de peixes e mariscos e de que como repensar o Rio e os possíveis cuidados que devemos ter com as suas águas, a despeito de tudo isso o que gerou foi um incômodo onde o Rio passou a ser temido, mas nunca esse incômodo foi voltado para o lixo que constantemente é jogado nas suas águas. Foi com esses questionamentos que o projeto Rio de Tudo Isso II foi pensado.

Em trabalhos anteriores já havia usado o rio como suporte como na performance Escombros (2014) em que naveguei a ermo por 3 horas seguindo apenas o tempo da maré e os redemoinhos que surgiam e que hora levavam a canoa para as pedras, ora me fazia ir de encontro as pequenas ilhotas que brotam no meio do rio.  Dessa vivência pude notar as diferentes tonalidades que as águas vão recebendo desde sua nascente até os círculos de gordura que impregnam e que flutuam teimosamente no seu curso.

As intervenções que aqui proponho pretende retirar parte das águas do rio e nessa coleta parte do lixo também será agregado, para depois ser congelado em formato de almofadas. Esses travesseiros e ou almofadas de mais de 50k cada um, somando-se ao todo mais de 30 deles, irão invadir a paisagem seca das duas cidades. Ali é onde meu corpo irá se relacionar, ora se esfregando nos travesseiros, ora tentando inutilmente dormir, até se despedir e deixar que os mesmos degelem totalmente. Enquanto derrete, será possível observar o lixo e os entulhos solidificados na água, eles vão aparecendo aos poucos até ficarem cruelmente expostos. É quando podemos padecer e questionar o que realmente pensamos sobre o Rio. Enquanto isso durante todo o dia as rádios comunitárias e o carro de som estarão invadindo o espaço seco das cidades emitindo uma sonoridade que é a do movimento do Rio, é como se houvesse uma enchente sonora que deverá ser ouvida em cada canto das duas cidades, sem pausa, sem fala, sem instrumentos e finalizando quando do degelo total. Nesse momento é quando o rio volta para o Rio, todas os travesseiros estarão posicionados perto do cais, para que a água retorne as águas, completando o seu ciclo. Ao desgelar todo lixo contido e escondido nos travesseiros solidificados, esses entulhos serão escancarados sujando a área seca das cidades, borrando a parte da cidade onde o lixo não deve aparecer. Mas escancara também a terrível verdade de que para mantê-las limpas e sem sujeira ao longo de tantos anos fruto de um descaso inconsequente e permanente foi permitido entulhar todo o lixo fazendo-a desaparecer nas águas turvas do grande Rio…

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